Caso Hope reacende debate sobre cannabis na veterinária
Remissão de câncer em cavalo tratado com canabinoides reabre discussão sobre o uso terapêutico da planta e a necessidade de regulamentação no país
por Juliana de Caprio em
e atualizado em
A história do cavalo Hope, resgatado em Florianópolis (SC) após ser encontrado com uma grave lesão na pata, reabriu espaço para debater sobre o uso de derivados da cannabis na veterinária.
Após meses de tratamento com canabidiol (CBD), o animal apresentou regressão significativa de um câncer, reacendendo a discussão sobre regulamentação e avanços científicos no uso terapêutico da planta em animais.
O caso ganhou repercussão nacional após a tutora Nina Hausen Kuhn e sua filha, a médica veterinária Duda Hausen Kuhn, relatarem a melhora de Hope, diagnosticado com sarcoide equino, um tipo de tumor agressivo que afeta a pele de cavalos.
Avanço regulatório impulsiona debate científico sobre cannabis na veterinária
A experiência de Hope trouxe reflexos diretos para a agenda regulatória nacional. Desde o final de 2024, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) passou a permitir o uso veterinário da planta em situações específicas, e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) incluiu o tema em seu plano de ação sobre a regulamentação da cannabis medicinal.
O Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) acompanha de perto o tema por meio da Comissão Nacional de Endocanabinologia Veterinária, presidida pela médica veterinária Caroline Campagnone.
“O caso do Hope mostra que estamos diante de uma mudança concreta na prática clínica. Nosso compromisso é garantir que a regulamentação avance com segurança jurídica e autonomia para que o médico veterinário prescreva conforme a necessidade de cada paciente”, afirma Campagnone.
O CFMV atua como interlocutor junto à Anvisa e ao Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), defendendo que a legislação reconheça as particularidades do uso veterinário. O órgão também tem participado como amicus curiae em ações judiciais, buscando assegurar o direito ao tratamento com canabinoides sempre que houver respaldo técnico e científico.
THC e os desafios da regulamentação completa
Um dos pontos mais debatidos é a regulação do tetraidrocanabinol (THC), composto psicoativo da planta que também apresenta ação analgésica e antitumoral comprovada. Segundo o CFMV, restringir o uso de THC pode limitar o acesso dos animais a terapias eficazes em casos de dor crônica e doenças oncológicas.
“Se queremos proteger os animais e oferecer alternativas terapêuticas seguras aos tutores, é fundamental que a regulação reconheça o valor de todos os compostos da planta”, reforça.
Nos próximos meses, o conselho deve intensificar o diálogo com órgãos reguladores para fomentar o registro de produtos veterinários específicos, incentivar pesquisas nacionais e fortalecer a fiscalização ética e técnica da prescrição.
Esperança, ciência e ética na prática veterinária
O caso de Hope se tornou um símbolo de esperança e de avanço científico na medicina veterinária brasileira. A recuperação do cavalo, que hoje apresenta cerca de 70% de remissão tumoral, reforça o potencial terapêutico da cannabis quando utilizada com acompanhamento especializado.
Para o CFMV, experiências como essa mostram que ciência e legislação precisam caminhar lado a lado. “A história de Hope é um alerta. Precisamos de marcos regulatórios sólidos que permitam o acesso responsável e seguro aos tratamentos com cannabis”, conclui Campagnone.